segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Decifra-me e...

Quando reativei este blog, comecei a visitar e reler posts antigos. Consequentemente uma série de lembranças vieram à tona, afinal este blog foi criado a princípio como uma brincadeira (alguém ainda lembra do cd do prof. Jorge Guido??) e acabou se tornando um meio de despejar algumas ideias, opiniões e sugestões. No final desta viagem, senti vergonha e uma vontade de deletar este blog. Primeiramente pela gramática e qualidade dos textos. Em segundo lugar, por retomar acontecimentos que me motivaram a escrever. Quero esclarecer que não são lembranças ruins ou traumáticas. O que me incomodou foi talvez a posição adotada por mim em cada um desses momentos. Depois de um breve dilema, decide manter os posts intactos. Afinal, eles são retratos do que fui, ou sou, ou estou sendo... Não sei... Mas refletem um pouco da mistura que eu sou. E podem vir a servir como um Manual sobre a minha pessoa. Não que alguém tenha interesse em ler. Manuais são chatos. Páginas e páginas, nunca vão direto ao ponto, linguagem confusa... Sempre deixamos de lado, guardados numa caixa, no fundo do armário. Mas eles estão lá, quem sabe um dia venham a ser úteis? Então...

Consideração



Ana aproveitava o intervalo do almoço para pagar umas contas. Ela não gostava de desviar a hora sagrada de descanso para resolver problemas, porém era um momento oportuno para tanto. Enquanto caminhava rumo à lotérica, Ana avistou um rosto familiar. Após um leve esforço, aquela feição encontrou dono: era Marta, uma amiga do tempo do colégio, que Ana havia perdido o contato desde o final do ensino médio, praticamente. "Já faz 8 anos". O estranho disso tudo é que o carinho que ela sentia por Marta não havia mudado. "Eramos grandes amigas, confidentes, parceiras". Infelizmente, cada uma seguiu seu caminho: Ana fez faculdade, formou-se em contabilidade e hoje trabalha em uma empresa de médio porte. Já Marta foi trabalhar como vendendora de imóveis e depois casou. A contadora até tentou manter o contato nos primeiros anos da iminente separação. Ligava, marcava um barzinho, cinema, uma balada.. Nos primeiros meses as duas até conseguiam sair juntas, porém o número de "saídas" foi diluindo com o passar dos mese até que perderam o contato. Ana estava empolgada em rever a amiga, afinal tinham tanta coisa para conversar, muitas novidades. Ela estava animada em reascender a chama daquela amizade. Quando as duas se depararam na esquina, cumprimentaram-se com um forte abraço, sorriram, trocaram algumas perguntas, até que surgiu um silêncio constrangedor. Marta imediatamente exclamou: "Devaríamos sair e por o assunto em dia". Ana rapidamente concordou. Mais uma onda de silêncio surgiu, e Marta fez aquela cara de "preciso ir, estou com pressa" e seguiu em frente, sem ao menos olhar para trás. A contadora, atordoada, então entendeu que aquela amizade não tinha mais retorno. Pior ainda, percebeu que ainda se importava com a ex-amiga e sentiu-se estúpida por isso.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Maratona oscar: A Origem (Inception)


Indicações:
- Melhor filme
- Melhor direção de arte

- Melhor fotografia
- Melhor trilha sonora original: Hams Zimmer
- Melhor edição de som

- Melhor mixagem de som

- Melhor efeitos visuais

- Melhor roteiro original


Christopher Nolan é um homem de respeito. Após ressuscitar a franquia Batman e levar os filmes sobre quadrinhos a um novo patamar, o diretor alcançou altos níveis de reconhecimento e sucesso. Para coroar e confirmar sua qualidade e não apenas momento de sorte, o diretor escreveu e dirigiu "A Origem", filme sem vínculo algum com o mundo dos HQs, com uma história original e toda bolada na mente de Nolan. A Origem é um filme técnico, porém não abandona o quesito enredo, mas até este aspecto foi elaborado visando a confecção de cenas que abusem de efeitos sonoros e visuais. São cenas realizadas com maestria, utilizando o melhor da tecnologia. Surpresa foi a falta das indicações de melhor diretor e edição.
Como citado anteriormente, A origem não se atém apenas aos quesitos técnicos. A complexa trama na verdade mascara uma premissa simples: Em um mundo onde é possível entrar na mente humana, Cobb (Leonardo DiCaprio) está entre os melhores na arte de roubar segredos valiosos do inconsciente, durante o estado de sono. Além disto ele é um fugitivo, pois está impedido de retornar aos Estados Unidos devido à morte de Mal (Marion Cotillard). Desesperado para rever seus filhos, Cobb aceita a ousada missão proposta por Saito (Ken Watanabe), um empresário japonês: entrar na mente de Richard Fischer (Cillian Murphy), o herdeiro de um império econômico, e plantar a ideia de desmembrá-lo. Para realizar este feito ele conta com a ajuda do parceiro Arthur (Joseph Gordon-Levitt), a inexperiente arquiteta de sonhos Ariadne (Ellen Page) e Eames (Tom Hardy), que consegue se disfarçar de forma precisa no mundo dos sonhos.
A Origem é um filme divertido,um deleite para fãs de efeitos especiais e também para aqueles que curtem uma bela trama. O filme conta ainda com as já excelentes composições de Hams Zimmer. Imperdível.

Maratona Oscar: O Vencedor




Indicações:
- Melhor filme
- Melhor diretor: David O. Russell

- Melhor ator coadjuvante: Christian Bale
- Melhor atriz coadjuvamte: Melissa Leo

- Melhor atriz coadjuvante: Amy Adams

- Melhor montagem

- Melhor roteiro original


É fato de que a Academia adora filmes sobre boxeadores. Outra fato é que este tema vem sido muito explorado e encontra-se até meio defasado. Então como atrair a atenção do público e da crítica arriscando uma temática meio batida? É que no filme "O Vencedor" o boxe é apenas um enfeite. O Vencedor não é um longa sobre o mundo do boxe, ou sobre como dar a volta por cima despistando as dificuldades, e sim um filme sobre família e suas complicações. E nisto ele é muito competente.
A história narra a vida real do boxeador Micky Ward (Mark Wahlberg), que busca o sucesso no esporte. Ele tem como treinador seu próprio irmão (Christian Bale) que outrora fora um famoso boxeador que despediçou suas oportunidades graças ao vício pelo crack. Para complementar a empreitada familiar, sua empresária é sua geniosa e protetora mãe (Melissa Meo), que precisa administrar o cuidado entre os nove filhos. Neste cenário Micky ve-se na escolha entre a famíia, que não por más intenções acaba atrapalhando sua carreira, ou seguir seu caminho longe deles e focar-se no seu sonho, ao lado da sua namorada espirituosa Charlene (Amy Adams).
O grande destaque da película são as ótimas atuações. Christian Bale rouba a cena com sua impressionante e comovente atuação, retratando um ex-boxeador viciado em crack, que tenta proteger seu irmão da sua maneira, porém acaba barrando a vida do caçula. Melisa Leo é outra cuja atuação possivelmente será agraciada com uma estatueta. Não é para menos, já que trata-se de uma bela performance. Fora isso, Amy Adams também exerce um ótimo e intenso papel.
O filme tem uma história comovente, aborda de maneira delicada as intensas relações familiares e a necessidade de se fazer escolhas e de contar com o apoio de quem se ama nas caminhadas da vida.


sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Maratona Oscar: 127 Horas






Indicações:
- Melhor filme
- Melhor ator: James Franco
- Melhor roteiro adaptado

- Melhor edição
- Melhor trilha sonora original: A.R. Rahman

- Melhor canção original: If I rise



Após o sucesso de "Quem quer ser um milionário?" o cineasta inglês Danny Boyle decide adaptar outra história: a incrível e real aventura de Aron Ralston, um engenheiro sedento por adrenalina, que nas horas livres procura contatos radicais com a natureza. Em uma de suas empreitadas, Aron sofre um acidente e se vê preso por um rocha que cai em cima de um dos braços, isolando o rapaz em um cânion distante no monte Utah. Começa então as 127 horas que o aventureiro passou numa intensa luta pela sobrevivência. Nos mais de 5 dias que Aron ficou preso, este experimenta diversas sensações, desde as necessidades fisiológicas mais básicas até o medo da morte, a reflexão sobre suas últimas atitudes para com a família e amigos e até a validade de perder um braço em troca da liberdade.
A qualidade do filme é sustentada não só pelo ótimo roteiro, que consegue encontrar atrativos e saídas em um filme que se passa, em sua maioria, dentro de uma apertada e pequena cratera, como pela ótima atuação de James Franco. Aliás, atuação fundamental, já que a maior parte da visão que o telespectador tem é do rosto de Franco. Porém o diretor consegue algumas escapadas inteligentes do roteiro, para aliviar um pouco a sensação claustrofóbica. A ótima trilha sonora auxilia em deixar o filme mais agradável e menos sufocante. Tem pouca ação, muita reflexão, mas não chega a ser massante. É um filme divertido, mas não indicado para pessoas que não curtem filmes mais "parados" e mais reflexivos.


Maratona Oscar: Cisne Negro (Black Swan)



Indicações:
- Melhor filme

- Melhor direção: Darren Aronofsky
- Melhor atriz: Natalie Portman
- Melhor fotografia

- Melhor edição


O cineasta Darren Aronofsky, que em sua empreitada anterior abordou o mundo das lutas livres, decidi aventurar-se pelos bastidores do balé clássico. Por tratar-se de um tema pouco atraente para o público em geral, o diretor criou um thriller psicológico conciliado à delicada, beleza e rigidez da famosa dança. Na trama, Nina (Natalie Portman) é uma dedicada e ingênua bailarina, que disputa o papel principal na releitura do clássico Lago dos Cisnes, reestruturada pelo obsessivo Thomas (Vincent Cassel). A disputa começa a intensificar-se com as pressões geradas pelo professor e pela mãe da dançarina (Barbara Hershey), uma frustada ex-bailarina que procura manter a filha isolada em um cásulo de proteção e perfeição, e pela entrada de uma nova bailarina (Mila Kuris), que é o oposto de Nina. Tais cobranças convergem para o psicológico de Nina, e em sua cabeça que todo o thriller se desenvolve. Ela começa a sentir os efeitos da rigidez e competição selvagem impostos pelo intenso regime de ensaios e a busca pela perfeição pacaba exigindo dela muito mais do que sua disposição física e emocional.
Cisne Negro é uma inteligente e bela abordagem dos bastidores do balé na cidade de New York. Representa uma clara crítica ao violento sistema de dispustas e intrigas que cercam as dançarinas, que muitas vezes torna-se demasiadamente violento e devastador para elas. Natalie Portman realizou uma incrível interpretação, realçando as diversas características apresentadas por Nina ao longo da trama, sem perder a delicada e beleza de uma bailarina. É a favorita a receber o prêmio de Melhor Atriz, e se isto acontecer, o prêmio estará em boas mãos. Outros destaques são a bela trilha sonora e a fotografia, que auxiliam em construir a beleza fatal da história, eficientemente trabalhada por Darren Aronofsky.
Cisne Negro não é um filme fácil, é confuso, necessita de certa atenção aos detalhes, entretanto, mesmo que o filme fosse ruim, o que não é o caso, o incrível e épico final já garantiria a ida ao cinema.





Trailer:

http://www.youtube.com/watch?v=5jaI1XOB-bs

domingo, 9 de janeiro de 2011

Covardia

E ele tinha medo da dor. Uma espécie de agliofobia. Um covarde, que preferia o marasmo da vida às emoções intensas. Tudo em sua vida era uma calmidão, como um fim de tarde em uma cidade interiorana. Nada era extremo, exagerado, intenso, vibrante. Preso à rotina, ele gostava daquilo tudo, pois era confortante, seguro. Ele tinha consciência de sua covardia e não se incomodava com isso. Para que se incomodar? Evita pessoas para poupar futuras dores. Não gostava de dores físicas. Não suportava as dores emocionais. A queimação no peito, a angústia que transpassava a garganta, as mãos suadas, os batimentos descontrolados eram tortura para aquele pobre homem. Evita olhar para si próprio, não queria incômodo. Tinha medo do que podia descobrir de si próprio. Covarde, covarde, covarde, ele dizia para si. Por sua covardia, deixara passar o emprego dos sonhos, o amor da sua vida, grandes amigos. Covarde, covarde, covarde. Odiava a agitação das cidades, o trânsito voraz, o ambiente competitivo das grandes coorporações, os indivíduos exibidos das academias, as pessoas fúteis das baladas. Na verdade ele odiava quase tudo. Seus poucos amigos, algumas pessoas tão estranhas quanto ele, tinham em comum algumas feridas e o medo iminente. Ele sofrera pouco, mas já achara suficiente. Acreditava que não valia a pena atravessar o fogo para conseguir algo. Era mais seguro permanecer quieto e esperar algo cair do céu. E ele esperava. Ficava sempre encolhido, sempre ao lado da oportunidade, esperando cair algumas migalhas. Covarde, covarde, covarde. Certa vez relacionou-se com uma bela mulher, latina, intensa, belo corpo, sonhadora, porém decidida e que não desistia do que queria. Ela era tudo o que ele poderia pensar em ser, mas para evitar desconfortos a ideia nem passou pela sua cabeça. Ela apareceu em sua vida de maneira inexplicável. Ele nem tentara entender, mas aproveitou a oportunidade, não porque ele merecia. Ele tinha consciência disso. Covarde, covarde, covarde. Tentara mante-la próxima, mas não tinha experiência e estrutura para isso. Assistira ela partir. Ele podia chorar, mas iria doer. Aquele choro podia salvar tudo. Cada um seguiu seu rumo. Ela, intensa como sempre, foi a procura de um novo amor e de outros sonhos. Ele, permaneceu em seu canto escuro à espera de uma possível outra oportunidade. Ele era paciente. Covarde, covarde, covarde. Um ano depois ela faleceu em um acidente de carro. Enquanto transava loucamente em seu carro, que estava parado em uma estrada, outro veículo desgovernado atingiu em cheio o casal. Morte instantânea. Quanto ao nosso covarde, este viveu por mais 30 anos. Conseguiu uma companhia razoável para dividir a vida, alcançou um cargo razoavel, teve filhos razoáveis, uma hipoteca razoável. Covarde, covarde, covarde. Razoável, razoável, razoável. No fim, ambos foram para o mesmo lugar. Pessoas diferentes, vidas diferentes e o mesmo fim, o esquecimento.

Cinzas

Ela não estava preparada para abrir mão daquilo tudo. Era a típica pessoa que "guardava lembranças". Seu armário estava lotado de livros, fotos, presentes, anotações, recados, enfeites. A dispensa não suportava mais caixas carregadas de "memórias" desde seu nascimento. Um costume cultivado desde sua avó, que guardara a primeira rosa, o primeiro bilhete lançado à janela, o vestido de casamento, e foi então passado para a mãe e posteriormente para Marcela. Disciplinada, ela seguiu à risca o hábito e tentara guardar tudo que fosse possível: boletins, fotos, prêmios, entradas de cinema e shows, cartas, cadernos, apostilas, livros, revistas, jóias, roupas, tudo aquilo que fizera ela ser a pessoa que é hoje. Era confortável saber que as lembranças estavam lá, ao seu lado, e que podiam ser consultadas a qualquer momento. O curioso é que Marcela nunca mexeu nesses entulhos. Tudo permanecia intacto, limpo, entretanto aquelas caixas nunca foram reviradas, os livros nunca folheados. Ela separava momentos para "polir" suas lembranças, retirar as películas de sujeira, relocar as caixas e abrir espaço para novas. Não era preciso abri-las. Na verdade, o prazer estava em deixá-las ali, sistematicamente ordenadas... Infância, Colégio Madre Tereza, Escola Ventura Souto, Faculdade, Praia, Amores, Família, Álbuns, Revistas...
Marcela era famosa por seu típico comportamento metódico e perfeccionista. Tudo no lugar certo, na hora certa. Nas festas que organizava, não parava um instante, sempre ocupada, na ânsia de proporcionar o melhor ambiente possível. Tinha mania de limpeza. Não admitia erros. Workaholic. Uma pessoa realmente admirável, esforçada, competente. Sempre fora a melhor aluna, melhor funcionária, melhor cozinheira, dona de casa, esportista. Nada dera errado. exceto desta vez... Enquanto o fogo tornava cinza sua casa perfeita, pela primeira vez Marcela não sabia o que fazer. Congelada diante do fato, os transeuntes que ali passavam não imaginavam que aquela vida perfeita, construída com muito esmero, era a tentativa de manter Marcela distante de si mesma. Ela não focava em seus problemas internos, pois estava ocupada demais organizando sua rotina. E agora? Que desculpa ela terá? Estava nua, desarmada. As únicas coisas que poderia salvar eram as caixas com as lembranças, as memórias intocadas. Enquanto o fogo devorava a casa, as caixas permaneciam intactas, resistindo a fúria das chamas. E Marcela continua va parada, observando tudo. E o fogo parecia evitar as lembranças. Ela podia correr e resgatá-las. Ela não estava preparada para abrir mão daquilo tudo. Foi então que uma viga flamejante atingiu em cheio tudo que encontrava-se dentro da dispensa e com isso a última parte de Marcela foi apagada. Ao final, apenas cinzas. Por um momento ela pensou que esta era uma oportunidade de recomeçar, desta vez sem todos os escudos criados ao longo de sua vida. Talvez fosse o momento de conectar-se às pessoas e principalmente a si própria. Talvez fosse um sinal. Um tempestuoso fluxo de pensamentos iniciara em sua mente. Rapidamente Marcela resolveu isso da maneira que melhor sabia. Organizou as ideias, foi atrás de algumas caixas e preencheu-as com cinzas da antiga casa.